21 de novembro de 2024

A cor da pele ainda espanta

Foto: Ricardo Bufolin/CBG

“Geneticamente, somos todos iguais”

 No início de outubro do ano passado, as principais TVs e portais já tinham escancarado a imagem. Em seguida, foram os jornais que mostraram em suas primeiras páginas a foto de três ginastas negras no mesmo pódio da prova “individual geral” do Mundial de Ginástica Artística, na Antuérpia, Bélgica.

Espanto…

O feito das nortes-americanas Shilese Jones (ouro) e Simone Biles (bronze) e da brasileira Rebeca Andrade (prata) surpreendeu e se tornou notícia “valorizada” por serem atletas negras! Lamentavelmente, ainda convivemos com essa diferenciação da cor da pele… É preciso entender que as ginastas competiram entre iguais, isto é, são seres humanos, antes de tudo! Por quê transformar a cor da pele em notícia?

Questão social

Espanto seria se tivéssemos uma negra ou um negro num valorizado pódio do tênis internacional, ou no hipismo; um nadador ou nadadora, por exemplo, considerando-se o seletivo acesso aos clubes que essas modalidades impõem. O negro não está, também, nesses pódios porque foram “eliminados” por questões sociais e econômicas, mas não pela falta de capacidade de praticar essa ou aquela modalidade.

Pesquisa

A propósito desse tema, na mesma época da notícia esportiva, o biólogo, geneticista e estatístico norte-americano, Alan Templeton, divulgou o resultado de uma pesquisa em que comparou mais de oito mil pessoas de várias partes do mundo, entre elas índios ianomamis e xavantes do Brasil. Uma de suas conclusões diz que “as diferenças genéticas entre grupos das mais distintas etnias são insignificantes”. Disse mais: “Encontrar um índio brasileiro não miscigenado ou mesmo um alemão puro da raça ariana é tarefa quase impossível.

Classificação

Em entrevista à imprensa da Universidade Federal de Minas Gerais, Templeton afirmou:

“Curiosamente, foi aqui no Brasil que há mais de 20 anos eu senti – digo senti porque ainda não era algo científico, mas emocional mesmo – o quanto é arbitrária a divisão dos seres humanos em raças. Um professor da Universidade de São Paulo me contou que, numa viagem aos Estados Unidos, percebeu que lá, diferentemente do Brasil, as pessoas morenas ou pardas são consideradas negras.

Foi aí que comecei a compreender que a classificação de pessoas em raças é feita a partir de uma vivência cultural.

Questão cultural

Ainda segundo o pesquisador norte-americano, “a definição de negro, para o brasileiro, é diferente daquela usada por quem mora no Alaska. O conceito de raça, ao contrário do que se acredita, não é biológico, mas cultural. Foi quando o repórter quis saber: “Se não existem raças, porque um negro norte-americano é tão diferente de um japonês ou de um índio maxacali? – indagou o repórter.

Explicação

Os genes, unidades que carregam todas as informações sobre o organismo de um ser humano, determinam as características físicas. Mas as partículas que definem a cor do cabelo ou o formato do rosto são tão poucas que perdem seu significado quando comparadas ao número total de genes. A cor da pele de uma pessoa pode representar uma adaptação biológica a certas condições geográficas ao longo de sua evolução. Na região de origem dos negros, por exemplo, o sol é bastante forte. Como o excesso de energia solar prejudica o organismo, a cor negra protege a pele contra os raios nocivos”. E concluiu Alan Templeton:

“Não importa se há diferenças na cor da pele, nas feições do rosto, na estatura ou origem geográfica. Geneticamente, somos todos iguais”.

 Todos são iguais

Seja por preceito religioso – “todos são filhos de Deus” – seja por direito constitucional – “todos são iguais perante a lei” –  a cor da pele entre brancos e negros ainda sustenta discussões que não se pode mais aceitar. Três atletas negras estarem no mesmo pódio é tão normal quanto três brancos recebendo medalhas. A valorização da notícia baseada na cor indigna.

Oportunidades

O resultado da ginasta brasileira, especificamente, não é “milagre”. Deve-se, principalmente, à oportunidade que teve de frequentar projetos sociais de órgãos públicos em comunidades carentes. Da mesma forma que já ocorreu com atletas do judô, da canoagem, do boxe e do atletismo, por exemplo. Mas esses projetos não se repetem no tênis, na natação, no hipismo, surfe… ainda reservados à elite social. Essa é a questão. Esse é o debate.

Foto: Ricardo Bufolin/CBG