Quando nasceu, há 63 anos, recebeu o nome de Areolino Afonso Ribeiro. Com o tempo e no ambiente do esporte, tornou-se conhecido como Professor Lino, do vôlei.
Em conversa detalhada, ele contou sobre a sua trajetória, até se aposentar das quadras e se tornar artistas, há 12 anos, começando com gravação de comerciais e evoluindo para curtas e longas e chegando às peças de teatro.
Luta, de verdade
Natural de Manaus, Lino traz do berço o espírito de luta. Não a “luta” poética ou do trabalho duro do dia a dia dos brasileiros. Mas a luta do combate intenso e de registro histórico, que orgulha o passado do Exército do Brasil.
Monte Castello
Lino falou emocionado lembrando as passagens que o seu pai Carlos Jovino Ribeiro contava. Pracinha que foi da Força Expedicionária Brasileira (FEB), Jovino estava no batalhão que tomou o Monte Castello, a sudoeste de Bolonha, na Itália, em fevereiro de 1945.
Historicamente, essa “tomada” consolidou-se na Batalha de Montese, quando morreram 451 brasileiros em combate, além de 2.722 feridos e acidentados e 58 desaparecidos ou aprisionados.
Depois de 239 dias e quatro ataques fracassados das forças aliadas contra os alemães, para ocupar aquele ponto estratégico, os “Pracinhas” da FEB avançaram e, numa investida decisiva, conquistaram Monte Castello. Era o dia 21 de fevereiro de 1945. Foi o último combate da Segunda Guerra com rendição incondicional do exército da Alemanha nazista, com 20.573 prisioneiros capturados. Dois meses depois desse histórico feito, a Alemanha se rendia e chegava ao final a Segunda Guerra Mundial.
Exemplos e lembranças
É desse soldado guerreiro, que retornou da Itália com oito costelas quebradas, que Lino tem lembranças e exemplos que o ajudaram a construir carreira de educador, pelo esporte, e agora, aposentado, se tornar artista que brilha no palco das artes, no cinema e no teatro.
“Em 1972, o meu pai vendeu tudo o que tinha em Manaus e trouxe a família para Brasília. Fomos morar na Quadra 56 do Cruzeiro e foi ali que começou a minha relação com a cidade e a minha história com o vôlei e com o mundo”
O Quadradão
Obedecendo o traçado da cidade, o final de cada quadra no Cruzeiro tem, ainda hoje, um espaço conhecido por “Quadradão”, espécie de rua sem saída. Era ali que a garotada se reunia e batia a sua bolinha, de vôlei, inclusive, sob a orientação do Sargento Luna.
“Luna era um abnegado pelo esporte e eu fui influenciado por ele, de quem recebi muito incentivo para me profissionalizar”.
Do “quadradão”, Lino foi para o Elefante Branco, escola pública de referência em Brasília. Ali, passou a treinar com Jerônimo Perdomo Soares, até hoje nome de respeito que influenciou e formou várias gerações no jogo de vôlei.
“Com 14 anos eu já estava na Seleção infanto-juvenil da cidade. O técnico era o César Orosco, treinador por devoção, um grande adversário de Perdomo, em quadra”.
A carreira de Lino avançava e se fortaleceu quando foi convidado pelo doutor Luchessi, presidente do Bauru Atlético Clube, interior de São Paulo, para jogar nessa equipe.
De saída, teve a resistência mãe, Eunice, que não concordou com aquela ideia de separar Lino da família, principalmente dos outros sete irmãos.
“Não sei o que o meu pai conversou com ela, mas houve o acordo e eu viajei. Um dia, ela foi me visitar, justamente quando eu estava doente, com febre, nada demais. Mas, o suficiente para motivar a minha volta pra Brasília, coincidindo com a convocação para a Seleção Estudantil de Brasília. E assim voltei a jogar no Minas Tênis Clube”, relembra Lino.
Mudança de rumos
Em 1976, transição de 15 para os 16 anos, Lino estava “no auge”. Jogou JEBs (Jogos Escolares Brasileiros) em Porto Alegre, no Colégio Parobé (foto). E foi no primeiro jogo, contra São Paulo, que Moreno, à época da Seleção Brasileira adulta, disse que Lino não tinha altura para jogar vôlei, mas reconhecia que se tratava de um jogador com muita habilidade técnica. Lino media 1,80 e aquele “elogio” mudou os rumos de sua carreira. “Decidi desistir de ser atleta para me tornar técnico”, afirmou.
A despedida como atleta ocorreu em 1979, quando Lino foi convocado para integrar a Seleção de Vôlei das Forças Armadas e, assim, acabou prestando homenagem ao seu pai, Pracinha da Força Expedicionária Brasileira. No mesmo ano, começou a frequentar o curso de Educação Física da Faculdade Dom Bosco.
Adote um Atleta
“Depois dessa reviravolta, Jerônimo Perdomo arrumou o meu primeiro emprego. Naquela época tinha o programa Adote um Atleta e eu ganhava R$ 800,00 mensais”.
Mesmo ainda sem uma metodologia de trabalho definida, Lino aplicava em quadra o que tinha aprendido até então. Anotava tudo sobre o treinamento, na equipe de base do Minas Brasília.
Com 20 anos, ocorreu outra mudança, dessa vez indo jogar no Prudentina, de Presidente Prudente, São Paulo, quando se sagrou campeão paulista da primeira divisão e campeão dos Jogos Abertos.
“Aí, já era os anos 1980 e eu passei mesmo a ser treinador. Comecei a entender a metodologia do vôlei, as condições para formar um bom jogador e levá-lo ao alto rendimento. Aquela última passagem por São Paulo me ajudou, pois aprendi muito sobre esse esporte. Durante o curso na Dom Bosco, fiz trabalhos de iniciação esportiva com a ajuda de um colega, o Paulo Frederico Dantas, o Paulo Pernambuco, já falecido. Era um excepcional formador de atletas”.
Em quadra, Lino e Paulo se tornaram adversários que se revezavam na conquista de títulos na cidade.
Professor e técnico
Nessa rotina, Lino tornou-se professor da prática de vôlei, no Colégio La Salle. Tempos difíceis, sem estrutura ideal. O treino era no asfalto. Mas todos os seus times tinham lugar garantido nas finais dos campeonatos de Brasília. E sempre contra o amigo Paulo Pernambuco.
Quando começou a treinar o La Salle, Maurício Thomas estava no time. Hoje, ele é um técnico de renome, auxiliar da atual Seleção adulta e com vários títulos conquistados dirigindo times no Brasil e no exterior. “Também treinei o André Gomes, que se sagrou campeão de vôlei de praia em parceria com Alemão”, contou Lino.
Na Seleção
Em 1983, Lino foi chamado para treinar a Seleção feminina de Brasília, que disputou o Campeonato da primeira divisão juvenil. No seu time estavam jogadoras que chegam à Seleção Brasileira, como Cilene Faleiro, Cora Barreira, Patrícia Axer e Cristina Lopes.
Lino também foi o técnico da ASMISA Nacional – Associação do Ministério da Saúde – patrocinada pelo Banco Nacional. Era um time semiprofissional, pois as jogadoras não viviam apenas do vôlei. Era o ano de 1986 e Lino foi treinar o time da Presmic Turismo, que tinha Marcos Parente como diretor da empresa. Enquanto isso, terminava o Mestrado na Universidade Católica, onde defendeu a tese que abordou “Os voos do voleibol candango sob as asas do capital”.
Em 1983, Lino dirigiu a Seleção Juvenil do Distrito Federal no Campeonato Brasileiro disputado no Guarujá, São Paulo. (foto abaixo)
Na Confederação
Em 1986, Brasília sediou o pré-olímpico para os Jogos de Seul. Foi quando Lino conheceu Paulo Márcio Nunes da Costa, que era o diretor técnico da Confederação Brasileira de Vôlei, CBV.
“Diariamente arrumávamos o local de treinamento para as seleções. E Paulo Márcio me acompanhou nas minhas atividades de técnico, que continuei a desempenhar. Um dia, Paulo pediu para ver o meu caderno de anotações. Ali tinha tudo registrado, a programação dia a dia, fatos importantes ocorridos, enfim, tudo. Soube, depois, que aquilo que eu fazia era o mesmo que a equipe técnica fazia na Seleção Brasileira. Assim, quando chegou o final do pré-olímpico, ele me mandou para Porto Alegre como assistente técnico da Seleção. Foi esse time (foto), com Fernanda Venturini, Márcia Fu, Ana Moser e a Cilene, de Brasília, que se sagrou campeã mundial juvenil de 1987, em Seul”.
No ano seguinte, Lino também estava na equipe técnica da Seleção Brasileira juvenil que conquistou o Sul-Americano e o infanto-juvenil.
Em 1986, Lino assumiu a cadeira de Metodologia do Voleibol e estágio da Faculdade Dom Bosco. Na mesma época, por sua experiência, aceitou o convite da então secretária de Educação, Eurides Brito, para elaborar o projeto Esporte à Meia Noite, que atendia menores de rua com atividades nas áreas de recreação das cidades satélites, a partir de Planaltina. “Com esse projeto, ganhamos vários prêmios, inclusive da Unicef”, afirmou Lino. Em 2000 foi aprovado em concurso para a Secretaria de Educação.
Novos holofotes
Nos últimos 12 anos, Lino começou uma atividade paralela à educação física e ao esporte: investiu em outro extremo, as artes. Começou com figurações em comerciais até chegar a produções maiores, mais elaboradas. Dali para os curtas e longas metragens e os palcos teatrais, claro.
Em determinado momento, uma agência deu a ele a oportunidade para falar numa propaganda de vacinas H1N1. O desempenho agradou em cheio e, a partir de então, não lhe faltou mais trabalho, fazendo publicidade, direto. Para isso, passou a explorar o seu visual, negro de barba e cabelo brancos, tudo aliado a uma boa expressão corporal e o gosto pela arte teatral.
“Esse perfil é difícil de encontrar para gravar comerciais. E tenho bom pique, repito o que for preciso uma determinada gravação, até que saia o meu melhor”.
Essa espécie de “ensaio” foi a porta de entrada para o teatro, que investiu, mesmo sem um curso de formação específica. É próprio de Lino a expressão corporal, gestos, entonação da voz. Num comercial para a Unimed, de Goiânia, por exemplo, foram dois dias de gravação, quando representou “Deus”. Em seguida foi convidado para um curta e, hoje, já tem mais de dez curtas metragens com gravações em Brasília, Goiânia, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. O seu trabalho pode ser encontrado na página de internet: www.linoribeiro.com
Longas
Entre os longas, já gravou “No Caminho para o Quilombo”, “Uma Loucura de Mulher” e “Amado”, esses dois últimos disponíveis no Globo Play.
Para isso, passa noites decorando o texto e ensaiando gestos. “Assim, não passo vergonha e não atraso o trabalho de ninguém”, diz ele, orgulhoso da rotina profissional a que se dedica, num trabalho em que é acompanhado pelos filhos, Rafael, com 35 anos, Felipe 30, e Pedro Thiago, 40. Desse time, Lino tem duas netas, Maria Clara, com 18 anos, e Maria Eduarda, 15, filhas de Pedro, que mora em Salvador.
“E acabamos de receber a gostosa notícia de que tem mais um bebê a caminho, filho de Felipe e Lize”, conta o vovô, orgulhoso.
Porém, o longa de referência na carreira de Lino é “Manual do Herói”, escrito e dirigido por Fáuston da Silva, em que ele faz o personagem Arturo, o vilão da história. O longa ainda está sem data de lançamento, mas Lino sugere expectativa: “Aguardem”.
Apoio de valor
Nessa rotina, que já dura 12 anos, uma personagem garante a retaguarda do ator Lino Ribeiro, a brasiliense Marília Gabriela de Sena Santana, sua companheira. “Ela também é formada em Educação Física, mas, analista de projetos, trabalha com tecnologia da informação. Um dos maiores apoios dela é me ajudar a preparar os textos, a me preparar para as gravações”, diz Lino, orgulhoso dos apoios afetivo e profissional que recebe.
Curtas
Entre os curtas que participou, destaca “A Última Valsa”, de 22 minutos, que tem a seguinte sinopse: Elias e seus filhos retornam pra casa depois de um dia extenuante, que irá mudar suas vidas. Em meio a palavras não ditas, à conflitos escondidos, eles tentam apenas chegar ao fim deste dia. Assista!
A Terra em que Pisar, dirigido por Fáuston da Silva, é outro curta com participação de Lino Ribeiro. Aborda o dia em que Joana decide participar de uma ocupação irregular de terra pública. A decisão lhe dará mais uma moradia, mas uma nova consciência política. Assista!
Referências
Para continuar melhorando no seu desempenho, Lino tem em Chico Santana, Lima Duarte, Toni Ramos e Antônio Fagundes os seus atores de referência. Ele também cita o jornalista e crítico teatral, Sérgio Maggio, como “uma figura humana espetacular e de competência inigualável”. E André Amaro, a quem também é muito grato, pela sensibilidade ao dirigir peças teatrais, assim como Alexandre Ribondi, autor, diretor e ator, morto este ano. “Eu sou muito grato a todos esses por acreditarem em mim e me ensinarem muito sobre essa arte”. Entre os autores Lino destaca o argentino Santiago Serrano, “pela forma como conduz as peças”.
“No futuro, no ano que vem, quem sabe, quero fazer uma peça do Santiago Serrano, dramaturgo argentino, o mesmo que escreveu o Último Tango, dirigido por Sérgio Maggio. Cheguei a participar do ensaio, mas tive que sair por problemas de saúde”
Enquanto a vez de Santiago Serrano não chega, Lino já tem um convite que o deixou orgulhoso, vindo do produtor e roteirista Matheus Martins, do Rio de Janeiro. Ainda não há detalhes, mas é uma peça inspirada em Nelson Rodrigues e Plínio Marcos.
Leituras
“Estudo pra não fazer besteira. A leitura abre a cabeça em qualquer área, cultural ou esportiva. Abre o horizonte para entender outros processos. Não adianta querer ser profissional se não tiver a cultura da leitura”
Respeito e saudade
“Quando a Seleção vinha jogar aqui eu sempre estava lá. Hoje, não tenho mais o mesmo tesão de ver treinos e jogos. As amizades são outras. Foi uma fase que passou. Sinto saudade e respeito por tudo o que aconteceu”
O novo palco
“O palco é a extensão da quadra de vôlei. Nos dois ambientes há uma exibição do ator, primeiro como dirigente, como atleta, como técnico… Hoje, como ator teatral”
DOIS AMORES