Por Hélio Tremendani e José Cruz
A brasiliense Fabíola Lima Constâncio, que chegou a ser a oitava do ranking brasileiro no vôlei de praia, teve uma surpresa quando retornou às quadras, dois anos depois de afastada para o tratamento de um câncer: a sua pontuação no ranking havia sido zerada. A medida fazia parte das normas da Confederação de Vôlei e o prejuízo em termos técnicos foi enorme. Sem pontos e fora do ranking, a atleta perde, por exemplo, as vantagens do patrocinador para as viagens e disputas do circuito nacional.
Atleta que se destaca como um dos ícones da cidade no vôlei de praia e atividades sócio-educativas que desenvolve, Fabíola, 35 anos, faz parte da geração brasiliense que já integra a história do desporto no Distrito Federal.
O início
Fabíola era uma criança habilidosa, mas a timidez dificultava o seu relacionamento. Orientada pela mãe, Maria de Fátima, foi para o esporte buscar maior integração social. A dança, inicialmente, depois a ginástica olímpica, o vôlei e, finalmente, o vôlei de praia. O pai, Francisco de Assis, contribuiu nessa carreira: “Ele foi a minha inspiração. Me incentivou muito no esporte”, diz ela.
Os primeiros contatos com o vôlei foram nas quadras do Sesi, em Taguatinga. Depois, foi jogar na AABB, AABR, Clube Unidade Vizinhança, ainda como juvenil. Nesse último clube chegou já como tricampeã dos Jogos Brasileiros Universitários, atuando pela UPIS, onde estudava Administração – gestão em hotelaria.
A transição
Porém, Fabíola achava que “não seria uma jogadora de ponta”. Por isso, não tinha pretensões de continuar na quadra. Foi quando se decidiu pelo vôlei de praia, começando pelas areias do Parque da Cidade, em Brasília, sua cidade natal. “Gostei da modalidade e, em parceria com Fabiana Silva, entramos no circuito brasileiro. Isso lá pelos 24 anos”.
A proposta evoluiu e, em 2015, depois de começar a temporada em 18º lugar, a dupla Fabíola/Thaísa Ferreira encerrou a temporada em oitavo lugar no ranking brasileiro. Em 2017, Fabíola sagrou-se campeã sul-americana, conquistando, também, a medalha de bronze no Campeonato Mundial Militar, em Walendorff, Alemanha, já como atletas da FAB, no projeto Força no Esporte, e sob a orientação técnica de Tiê Santana.
A doença
Fabíola jogou até 2018, quando soube que precisaria parar para tratar de um câncer. As mudanças em suas rotinas foram inevitáveis.
“Fiquei fora de quadra por um ano, em tratamento. No fim das contas, foram dois anos afastada e isso zerou a minha pontuação, segundo o antigo regulamento da Confederação Brasileira de Vôlei. Até argumentei e mostrei o problema enfrentado, esperando que entendessem a gravidade daquele momento, mas, não adiantou”
Reação
Quando recebeu a notícia de que tinha um câncer, Fabíola não encarou como uma sentença de morte.
“O atleta aprende a lidar com derrotas e a se recuperar rapidamente. Encarei como se fosse, literalmente, um jogo. Tinha um novo adversário a enfrentar… E pensei assim: a doença entrou o meu corpo, mas não entrará na minha mente. Vou manter a mente forte e não vou permitir ter mais um problema. Também me mantive em movimento, em atividade física, mas, dentro dos meus limites, claro”
Estrutura forte
Em 2023, lamentavelmente, ela precisou refazer o seu planejamento, pois o câncer havia voltado. Porém, na conversa de pouco mais de uma hora com essa atleta, não se observa uma só manifestação de lamentos. Ao contrário, ouve-se palavras de otimismo, de planos e avanços.
Legislação
Fabíola jogou até 2018, parou em 2019 para o tratamento e retornou em 2021. Nesse tempo, ela conseguiu o apoio do deputado distrital Rodrigo Delmasso, que apresentou e aprovou um projeto de lei na Câmara Legislativa do Distrito Federal, mantendo a pontuação dos atletas em tratamento de saúde.
Planos
Fabíola não esconde que gosta de ser atleta e sente falta de competir. Não gosta de treinar por treinar, mas para manter uma rotina com vistas a um determinado foco, o jogo, justamente o que não pode fazer, agora. Estava nesse impasse, sem conseguir ter uma meta quando decidiu fixar uma: praticar corridas de rua.
“Voltar para o vôlei de praia como emprego é difícil, devido à medicação que recebo, o que dificulta o meu melhor rendimento. Por isso me decidi pelas corridas e ter maior dedicação ao Instituto Esporte e Saúde Fabíola Consttâncio, que fundei”
Nesse Instituto, ela promove eventos, como as corridas de rua, em que busca usar o esporte como apoio à valorização das mulheres, em especial as que passam pelo memo problema que ela.
Além disso, Fabíola voltou a estudar e faz Educação Física da Universidade Católica, onde desenvolve um projeto de pesquisa para demonstrar a importância da atividade física como benefício ao tratamento do câncer de mama.
O esporte
Fabíola avalia que o vôlei de praia em Brasília cresceu muito e que a cidade tem muitos atletas no circuito brasileiro. Porém, sente falta de um maior incentivo da prática esportiva nas escolas, principalmente nestes tempos em que “os pais estão com a cabeça mais aberta para que os seus filhos se tornem atletas”. Além disso há incentivos do governo, como a Bolsa Atleta e a Lei de Incentivo ao Esporte, assim como as bolsas oferecidas por universidades, como o Uniceub e a UPIS.
“Mas, também se observa que a maioria dos projetos de iniciação não têm longevidade para que se construa um atleta”, diz ela. E cita o exemplo de que as mudanças de governo acabam influenciando nas mudanças dos projetos que até então existiam.
Atualmente, Fabíola trabalha num projeto de iniciação ao vôlei de praia, no Sesc Olímpico, na Ceilândia.
“Desde 2022 sou coordenadora desse projeto, que tem estrutura muito boa, tipo um clube, uma academia. Destina-se à criançada, a partir dos 14 anos, que gosta muito. Até se observa que há uma migração do vôlei de quadra para o de areia. Se esse aprendizado avançar até a fase adulta, a ideia é criar atletas de alto rendimento”
Executiva otimista
Fabíola faz planos e fala sobre os seus projetos de executiva no esporte, também. A sua estrutura de atleta se sobressai com otimismo como diante de um adversário, em quadra. E expõe a realidade de que ali está uma vencedora, também fora do campo de jogo, que ela tão bem conhece.
*As fotos que ilustram esta matéria são do arquivo pessoal de Fabíola.